sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Algumas marcas não se podem apagar



Eu era pequenina quando saí de casa e deixei pra trás uma vida que era construída à base de ruínas, dores e prantos.
Papai batia na mamãe e eu acabava servindo de teste para sua mão grande e pesada.
Cada tapa movia uma ira grande dentro de mim, mas não entendia os motivos para tanta crueldade.
Acabei fugindo de casa, chamei a polícia e papai foi preso, mas nessa noite que fugi, procurando ajuda, mamãe apanhou tanto que não resistiu aos ferimentos e faleceu.
Eu tinha tudo que queria, papai era dono de uma empresa de propagandas, a maior na região em que morávamos, mas tinha algo que eu nunca consegui ter que era a paz dentro de casa, a paz dentro de mim mesma.
Cada vez que via aqueles olhos enfurecidos indo na direção de mamãe, o medo tomava conta do meu ser e as lágrimas de raiva eram transparecidas na minha face, numa forma de desespero e petição por paz.
Uma vez, mamãe disse que não importa o que temos na vida, mas quem temos na vida. Ela nunca ligou para o dinheiro que tínhamos, mas para quem tínhamos. Infelizmente ela não teve um bom marido e talvez nem uma boa filha, mas eu tive a melhor mãe e hoje ela vive dentro de mim, me acalmando e dando forças para continuar a viver assim.
Sem ter onde viver tive que ir morar num orfanato. No início os prantos eram demais. Tinha medo de apanhar e ser rejeitada pelas pessoas, mas, com o tempo, construí amigos lá dentro. Minha vida está sendo construída por um alicerce de amizade e união que tenho. Nunca soube o que era uma família regada de amizade e agora sei que é a base para uma estrutura firme.
Hoje, tenho o que sempre quis, só queria que mamãe pudesse ver como me sinto, por ter construído uma família com amigos que a vida me proporcionou através do pior acidente da minha vida.
Sei que as coisas acontecem por algum motivo, não troco essa minha família por nada... Mas queria tê-la aqui e assim ela poderia sentir como é bom receber o carinho das pessoas, sem receber surras, sem espancamentos; pois não se pode levar nada através da violência, a não ser o trauma que possuiu-me e com muita garra consegui me libertar, mas jamais conseguirei apagar totalmente da memória.

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Postado por
Natalia Araújo, do blog Revelando Sentimentos

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